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André Castro Santos*
Em novembro deste ano será realizada a COP 27, na cidade de Sharm El Sheikh, no Egito. Com a proximidade deste evento anual, a pauta climática ganha força em diversas esferas de debate. É positivo o fato de a COP ser um assunto cada vez mais recorrente e conhecido, mesmo por pessoas que não trabalham diretamente com o tema das mudanças climáticas. Mas muitos ainda não sabem o que exatamente a COP é.
COP é uma sigla em inglês que significa “Conference of the Parties”. Na tradução para o português, a sigla também funciona: “Conferência das Partes”.
“Partes”, nesta sigla, se refere aos países que fazem parte da Convenção-Quadro das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas, tratado internacional que costuma ser referenciado pela sua sigla em inglês: UNFCCC (United Nations Framework Convention on Climate Change). A Convenção-Quadro foi aberta para assinaturas em 1992, durante a Conferência Rio-92, mas entrou em vigor apenas em 1994. Por isso, desde 1995, as Partes da UNFCCC reúnem-se anualmente, para avançar na implementação das medidas e compromissos definidos no tratado internacional.
Dessa forma, em 2022 será realizado o 27º encontro das Partes da UNFCCC. Desde 1995, houve COP em todos os anos, exceto em 2020, quando o evento foi cancelado em decorrência das restrições sanitárias impostas pela COVID-19.
Mais do que uma reunião entre partes de um tratado internacional de mudanças climáticas, a COP é hoje o principal fórum de debate sobre meio ambiente em escala global. A conferência reúne representantes de mais de 196 países para tratar de questões ambientais de modo geral e das mudanças climáticas em específico.
Para além disso, a COP assumiu papel tão ou mais relevante que a Assembleia Geral da Nações Unidas, que ocorre também anualmente em Nova Iorque. Diferente da Assembleia Geral, a COP é itinerante e cada ano é sediada em um local, transitando pelos continentes, o que lhe traz uma legitimidade diferenciada e aproxima líderes globais de diferentes realidades territoriais e de povos que são impactados de maneira diversa entre si pelos efeitos das mudanças climáticas.
Por ser um fórum internacional de debate de alto nível, na COP revelam-se também diversas questões geopolíticas. A COP 27, por exemplo, terá que lidar com desafios que extrapolam a pauta climática, mas impactam decisivamente nos acordos que podem vir a ser alcançados, como a guerra na Ucrânia e a crise de relação diplomática entre Estados Unidos e China relacionada a Taiwan. O fato de a COP não ser sediada nos Estados Unidos, como é o caso da Assembleia Geral da ONU, dá outro tom a questões internacionais conflituosas entre lideranças ocidentais e orientais.
Além das relações estremecidas entre Leste e Oeste, a COP é também palco de intensos debates entre Norte e Sul Global, relacionados sobretudo à justiça climática. Países em desenvolvimento são aqueles que menos contribuíram historicamente com emissão de gases de efeito estufa, mas são os que mais sofrerão – e já vêm sofrendo – os impactos do aquecimento global, sobretudo por causa da menor capacidade relativa destes de investir em medidas de adaptação. Por isso, a COP é um espaço em que países mais pobres buscam recursos, apoios e compromissos dos países desenvolvidos para auxiliá-los no enfrentamento da crise climática, enquanto os países ricos, de modo geral, propõem algum nível de compromissos que não onere demasiadamente suas economias, ao mesmo tempo em que também tentam trazer algum grau de responsabilidade aos países emergentes como China, Índia e Brasil.
Em termos operacionais, a COP é o órgão supremo da UNFCCC e mantém sob exame sua implementação e de quaisquer de seus instrumentos jurídicos. Entre as suas atribuições, estão o exame periódico e a tomada de decisão de implementação das obrigações assumidas pelas Partes, a promoção da cooperação e do intercâmbio de informações entre os países, o apoio ao aperfeiçoamento metodológico para elaboração de inventários de emissões e a avaliação dos efeitos gerais das medidas tomadas no âmbito da Convenção.
A COP conta com dois órgãos fixos que orientam e apoiam seus trabalhos: o Órgão Subsidiário de Aconselhamento Científico e Tecnológico (SBSTA) e o Órgão Subsidiário de Implementação (SBI). Esses órgãos são espaços de discussão técnica pelos países-membros da Convenção, que, sob demanda da COP, elaboram recomendações que auxiliam na tomada de decisão das Partes.
Em paralelo às reuniões das Partes sobre a UNFCCC, no mesmo período e no mesmo local onde acontece a COP, também se reúnem a CMP e a CMA. A primeira é a Reunião dos países que são Partes do Protocolo de Kyoto e a segunda é a reunião dos países que aderiram ao Acordo de Paris. Estes dois tratados estão dentro do quadro regulatório da UNFCCC, mas são operacionalmente independentes, o que significa que nem todas as Partes da Convenção são Partes do Protocolo de Kyoto ou do Acordo de Paris.
Assim, é possível dizer que cada tratado da UNFCCC tem sua própria “COP”, cada uma tratando de seus assuntos específicos e reunindo grupos de países que não são idênticos, embora haja relevante sobreposição. Vale ressaltar, ainda, que os órgãos subsidiários da UNFCCC também podem servir à CMP e à CMA, apoiando as tomadas de decisão destes colegiados.
Por fim, destacamos que, embora com alguns retrocessos no percurso, a COP tem se tornado, ao longo do tempo, um ambiente mais inclusivo a atores além daqueles que representam os países que são Partes da UNFCCC, do Protocolo de Kyoto e do Acordo de Paris. Sociedade civil, governos subnacionais e o setor privado têm ocupado posição cada vez mais relevantes nos espaços de debate e pressionado os tomadores de decisão a avançarem de modo mais decisivo na agenda climática.
Como se vê, a COP é um ambiente complexo, tanto do ponto de vista político, quanto operacional, mas absolutamente necessário para garantir o processo de cooperação global para enfrentamento da crise climática, que é o maior desafio da humanidade neste século. Todo ano, os principais líderes globais têm a oportunidade de assumirem compromissos mais ambiciosos que, em maior ou menor escala, impactarão a vida de todos os habitantes do planeta. Por isso, deve ser de interesse de todos acompanhar o andamento das negociações durante as duas semanas em que ocorrem os trabalhos da COP e estar atentos ao que os representantes de seus países estão levando e trazendo deste fundamental espaço de negociação política internacional.
* Pesquisador, advogado e geógrafo. Coordenador do Eixo de Pesquisa & Desenvolvimento da Latin American Climate Lawyers Initiative for Mobilizing Action (LACLIMA) e membro do Conselho Consultivo Acadêmico da Youth Climate Leaders (YCL). Mestre em direito ambiental pela USP e doutorando em Alterações Climáticas e Políticas de Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Lisboa e em direito ambiental pela USP.
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